LE BLANC, Charles. Kierkegaard. Trad.: Marina Appenzeller. São Paulo: Estação liberdade, 2003.
p.11-15
As grandes datas
1813 Nascimento a 5 de maio, em Copenhague, de Soren Aabye Kierkegaard. No mesmo ano nascem Wagner, Hebbel e Verdi.
1818 Nascimento de Karl Marx.
1820 Kierkegaard conhece o bispo Mynster.
1830 Kierkegaard se inscreve na universidade.
1831 Morte de Hegel.
1837 Kierkegaard conhece Regina Olsen; leciona latim por algum tempo em um liceu de Copenhague.
1838 Morte de seu professor e amigo P. M. Meller em março. Morte de seu pai a 8 de agosto. Dele recebe uma grande herança. Sofre seu "terremoto", nome que dá à grande crise espiritual que o transformará.
1840 Kierkegaard passa em seu exame de teologia (2 e 3 de julho) e, a 10 de setembro, fica noivo de Regina Olsen.
1841 A 29 de setembro, defende sua dissertação, Om Begrebet ironi [ O conceito de ironia], para obter o grau de Magister Artium; a 11 de outubro, rompe o noivado e, alguns dias depois, vai a Berlim acompanhar os cursos de Schelling (Filosofia da revelação). Feuerbach publica A essência do cristianismo.
1843 Publicação de Enten-Eller [ Ou ... ou ... ], Fryght og Bsevea [Temor e tremor], Gjentagelsen [A repetição]. Segunda viagem a Berlim.
1844 Publicação de Philosophiske Smuller [Migalhas filosóficas] (1846) e de Begrebet Angest [Conceito de angústia]. Nascimento de Nietzsche.
1845 Publicação de Stadier paa Livets Vei [Estádios no caminho da vida]. Terceira viagem a Berlim.
1846 Em janeiro, Corsaren [O Corsário], jornal satírico, inicia seus ataques contra Kierkegaard. Publicação do Afsluttende uvidenskabelig Efterskrift [Post-scriptum final não-científico às migalhas filosóficas]. Quarta viagem a Berlim.
184 7 Kierkegaard visita várias vezes o rei Cristiano VII.
Publicação de Kjerlighedens Gjerninger [ Obras do amor]. Em novembro, Regina Olsen desposa F. Schlegel.
1849 Publicação de Sygdommen til Deden [A doença até a morte]. Kierkegaard escreve a Regina para explicar sua conduta. A carta é devolvida sem ter sido aberta. Nascimento de Strindberg.
1850 Iniciam-se os problemas financeiros. Publicação de Indevelse i Christendom [Escola do cristianismo].
1851 Kierkegaard publica vários Opbyggelige Taler [Discursos edificantes].
1854 Morte do bispo Mynster.
1855 Kierkegaard entra em polêmica com a Igreja dinamarquesa, sobretudo com Martensen; edita, pagando de seu bolso, um panfleto, 0ieblikket [ O instante]. Regina abandona a Dinamarca para ir morar nas Antilhas (março). Em 2 de outubro, Kierkegaard perde os sentidos em uma rua de Copenhague. Morre, arruinado, a 11 de novembro, recusando a comunhão.
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Prefácio
Existem verdades nas quais temos de comprometer a nós mesmos, tão essenciais que a existência é incompreensível sem elas, e sem as quais a vida não tem sentido.' Essas verdades não fornecem o em si do sentido da vida, objetivo e intemporal, mas um sentido para si, para a subjetividade, para aquele indivíduo concreto que vive aqui e agora, cuja alma é incessantemente agitada pelas incertezas da existência e pelas escolhas diante das quais ela o coloca.
Como o pensamento filosófico (entenda-se especulativo), interessado pelas coisas em si e construindo sistemas abstratos, poderia explicar a situação real e existente do indivíduo que sofre, se desespera, ama e morre? A verdade para esse indivíduo é apenas um problema de conceito? Não seria antes algo de que devemos nos apropriar, tornar nosso, uma verdade para si? A verdade que importa ao indivíduo presa das vicissitudes da existência pode ser ensinada em uma cátedra universitária? Não exige que dela nos tornemos testemunhas ao longo de todo o caminho da vida, por meio da experiência da angústia e do desespero?
É a convicção de Seren Kierkegaard. Ele quer descobrir as condições que permitem apropriar-se do saber, torná-lo seu, chegar a um conhecimento que satisfaça tanto as exigências da intelectualidade quanto às da existência e da interioridade.
"Trata-se de achar uma verdade que seja única para mim, encontrar a idéia pela qual eu queira viver ou morrer. " ¹
Soren Kierkegaard luta contra o Sistema - não existe sistema da existência -; contra o idealismo - a existência não é redutível ao pensamento sobre a existência-; enfim, contra o panteísmo - Deus não se confunde com o Espírito absoluto de Hegel e não é o ponto de remate do desenvolvimento dialético da idéia filosófica.
Pensador religioso, preocupou-se - aí repousa toda sua atividade de escritor - em colocar em evidência as ilusões confortáveis nas quais via se perderem os cristãos de seu tempo: para tratar de reconduzi-los à via dolorosa de um cristianismo jamais adquirido, por "natureza" sempre incômodo, sempre exigindo mais um sofrimento, de um cristianismo autêntico; para tentar mostrar-lhes o que poderia de fato significar e prometer esse "devir cristão" ao qual os chamava. Não se contentar em ser cristão, mas ter de sê-lo, onde a ênfase está, em primeiro lugar, no esforço e no movimento: ter de ser.
Assim, ele foi levado a apresentar, por meio de uma obra desconcertante - de tanto que mescla os gêneros -, a existência em sua irredutibilidade a algo que não ela mesma, em sua singularidade, sob uma nova luz - não objeto determinável de saber, mas indeterminação sob o apelo da transcendência, produzindo temas e conceitos (angústia, ironia, liberdade, responsabilidade, opção, autenticidade, etc.) que tiveram um destino considerável, bem além daqueles a quem Kierkegaard tentava influenciar: ele é considerado o pai do existencialismo, e a dívida é reconhecida, por vezes com reticência, de Gabriel Marcel a Jean-Paul Sartre, passando por Karl Barth, Martin Heidegger, Léon Chestov, Emmanuel Lévinas e Vladimir Jankélévitch.
1. ]ournal, IA 75. [Utilizamos os títulos em francês das edições indicadas pelo
autor sempre que vierem acompanhados de número de página ou volume. Na
primeira vez em que aparecer referência a obras de Kierkegaard
registraremos o título original em dinamarquês e, entre colchetes, a tradução em português; nas
vezes seguintes, utilizaremos somente o título em português, com exceção dos
casos anteriormente indicados. (N. Ed. Bras.)]
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