segunda-feira, 5 de setembro de 2016

LE BLANC, Charles. Kierkegaard - PREFÁCIO



LE BLANC, Charles. Kierkegaard. Trad.: Marina Appenzeller. São Paulo: Estação liberdade, 2003.


p.11-15
As grandes datas  
1813 Nascimento a 5 de maio, em Copenhague, de Soren Aabye Kierkegaard. No mesmo ano nascem Wag­ner, Hebbel e Verdi. 

1818 Nascimento de Karl Marx. 

1820 Kierkegaard conhece o bispo Mynster. 

1830 Kierkegaard se inscreve na universidade. 

1831 Morte de Hegel. 

1837 Kierkegaard conhece Regina Olsen; leciona latim por algum tempo em um liceu de Copenhague. 

1838 Morte de seu professor e amigo P. M. Meller em março. Morte de seu pai a 8 de agosto. Dele re­cebe uma grande herança. Sofre seu "terremoto", nome que dá à grande crise espiritual que o trans­formará. 

1840 Kierkegaard passa em seu exame de teologia (2 e 3 de julho) e, a 10 de setembro, fica noivo de Regina Olsen. 

1841 A 29 de setembro, defende sua dissertação, Om Begrebet ironi [ O conceito de ironia], para obter o grau de Magister Artium; a 11 de outubro, rompe o noivado e, alguns dias depois, vai a Berlim acom­panhar os cursos de Schelling (Filosofia da revela­ção). Feuerbach publica A essência do cristianismo. 


1843 Publicação de Enten-Eller [ Ou ... ou ... ], Fryght og Bsevea [Temor e tremor], Gjentagelsen [A repe­tição]. Segunda viagem a Berlim. 

1844 Publicação de Philosophiske Smuller [Migalhas fi­losóficas] (1846) e de Begrebet Angest [Conceito de angústia]. Nascimento de Nietzsche. 

1845 Publicação de Stadier paa Livets Vei [Estádios no caminho da vida]. Terceira viagem a Berlim. 

1846 Em janeiro, Corsaren [O Corsário], jornal satí­rico, inicia seus ataques contra Kierkegaard. Pu­blicação do Afsluttende uvidenskabelig Efterskrift [Post-scriptum final não-científico às migalhas filosóficas]. Quarta viagem a Berlim. 

184 7 Kierkegaard visita várias vezes o rei Cristiano VII. 

Publicação de Kjerlighedens Gjerninger [ Obras do amor]. Em novembro, Regina Olsen desposa F. Schlegel. 

1849 Publicação de Sygdommen til Deden [A doença até a morte]. Kierkegaard escreve a Regina para explicar sua conduta. A carta é devolvida sem ter sido aberta. Nascimento de Strindberg. 

1850 Iniciam-se os problemas financeiros. Publicação de Indevelse i Christendom [Escola do cristianismo]. 

1851 Kierkegaard publica vários Opbyggelige Taler [Discursos edificantes]. 

1854 Morte do bispo Mynster. 

1855 Kierkegaard entra em polêmica com a Igreja di­namarquesa, sobretudo com Martensen; edita, pa­gando de seu bolso, um panfleto, 0ieblikket [ O instante]. Regina abandona a Dinamarca para ir morar nas Antilhas (março). Em 2 de outubro, Kie­rkegaard perde os sentidos em uma rua de Co­penhague. Morre, arruinado, a 11 de novembro, recusando a comunhão. 



Prefácio


Existem verdades nas quais temos de comprometer a nós mesmos, tão essenciais que a existência é incompreen­sível sem elas, e sem as quais a vida não tem sentido.' Essas verdades não fornecem o em si do sentido da vida, objetivo e intemporal, mas um sentido para si, para a subjetividade, para aquele indivíduo concreto que vive aqui e agora, cuja alma é incessantemente agitada pelas incertezas da existência e pelas escolhas diante das quais ela o coloca.
Como o pensamento filosófico (entenda-se especulativo), interessado pelas coisas em si e construindo sistemas abs­tratos, poderia explicar a situação real e existente do indi­víduo que sofre, se desespera, ama e morre? A verdade para esse indivíduo é apenas um problema de conceito? Não seria antes algo de que devemos nos apropriar, tornar nosso, uma verdade para si? A verdade que importa ao indivíduo presa das vicissitudes da existência pode ser ensinada em uma cátedra universitária? Não exige que dela nos tornemos testemunhas ao longo de todo o caminho da vida, por meio da experiência da angústia e do desespero? 
É a convicção de Seren Kierkegaard. Ele quer descobrir as condições que permitem apropriar-se do saber, torná-lo seu, chegar a um conhecimento que satisfaça tanto as exigências da intelectualidade quanto às da existência e da interioridade. 

"Trata-se de achar uma verdade que seja única para mim, encontrar a idéia pela qual eu queira viver ou morrer. " ¹


Soren Kierkegaard luta contra o Sistema - não existe sistema da existência -; contra o idealismo - a existência não é redutível ao pensamento sobre a existência-; enfim, contra o panteísmo - Deus não se confunde com o Espírito absoluto de Hegel e não é o ponto de remate do desenvol­vimento dialético da idéia filosófica. 
Pensador religioso, preocupou-se - aí repousa toda sua atividade de escritor - em colocar em evidência as ilusões confortáveis nas quais via se perderem os cristãos de seu tempo: para tratar de reconduzi-los à via dolorosa de um cristianismo jamais adquirido, por "natureza" sempre in­cômodo, sempre exigindo mais um sofrimento, de um cris­tianismo autêntico; para tentar mostrar-lhes o que poderia de fato significar e prometer esse "devir cristão" ao qual os chamava. Não se contentar em ser cristão, mas ter de sê-lo, onde a ênfase está, em primeiro lugar, no esforço e no mo­vimento: ter de ser. 
Assim, ele foi levado a apresentar, por meio de uma obra desconcertante - de tanto que mescla os gêneros -, a existência em sua irredutibilidade a algo que não ela mes­ma, em sua singularidade, sob uma nova luz - não objeto determinável de saber, mas indeterminação sob o apelo da transcendência, produzindo temas e conceitos (angústia, iro­nia, liberdade, responsabilidade, opção, autenticidade, etc.) que tiveram um destino considerável, bem além daqueles a quem Kierkegaard tentava influenciar: ele é considerado o pai do existencialismo, e a dívida é reconhecida, por ve­zes com reticência, de Gabriel Marcel a Jean-Paul Sartre, passando por Karl Barth, Martin Heidegger, Léon Chestov, Emmanuel Lévinas e Vladimir Jankélévitch. 


1.     ]ournal, IA 75. [Utilizamos os títulos em francês das edições indicadas pelo autor sempre que vierem acompanhados de número de página ou volume. Na primeira vez em que aparecer referência a obras de Kierke­gaard registraremos o título original em dinamarquês e, entre colchetes, a tradução em português; nas vezes seguintes, utilizaremos somente o títu­lo em português, com exceção dos casos anteriormente indicados. (N. Ed. Bras.)]

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